Viver a
vida plantando sonhos e desafios pode ser
extremamente estimulante, não há a menor dúvida disso, só que, ao
mesmo tempo, sem nos darmos conta, pode ser sutilmente embriagador.
Aproveitamos do presente aquilo que nos dá de melhor e o que não é tão bom assim torna-se um
pouquinho mais digerível, pois aconteça o que acontecer no "aqui
e agora", já temos o outro pé fincado na "estrada
do porvir". E, mais a mais, sabemos muito bem aquilo que queremos ou que, inexoravelmente, é bom pra gente. Será
mesmo?
Quando vivemos
a nossa vida num grande fluxo natural de um caminho cheio de bifurcações,
subidas, descidas, rios, vales, desertos etc_ no qual estamos
perfeitamente encaixados, ir colocando "setas" e "sinais"
durante o percurso pode até ser bom para nos animar, ou nos chacoalhar um
pouquinho, mas não pode, ao meu ver, jamais ser maior do que a
paz em nosso coração no momento presente.
Se sabemos que todas as coisas contribuem juntamente
para o bem daqueles que estão na verdade (Romanos 8.28), estejamos nós em que momento da caminhada estivermos,
devolvemos essa segurança vivendo ali da melhor forma possível. Não por
determinação, mas pelo sentimento de entrega que é maior que tudo. Assim,
deixamos de julgar a beleza do vale cheio de flores e pássaros em comparação
com o mato descolorido de graça ou mesmo o deserto sem água. Nossos olhos
conhecem bem a beleza, mas só os olhos da alma conseguem ver maravilhas onde
nada aparentemente cresce.
Quando
nos permitimos viver a nossa vida sabendo que todas as escolhas, momentos,
lugares e situações que estamos simplesmente são o que tem que ser, nosso
coração muda. Sentimos sempre que estamos na direção certa, pois tudo agora faz
parte de um grande plano, onde vamos fluindo de forma suave, generosos conosco
e com tudo o que temos. A entrega deve vir antes da escolha. Entregar é um ato
de fé, de coragem muito maior e mais revolucionário do que se possa
supor. Os objetivos, as decisões, os novos rumos todos passam a acontecer
dentro de um propósito. Não existem mais o certo e o errado, bom e ruim,
ou mesmo “estou aqui de passagem”, ou “aqui não é o meu lugar”, “e se eu
tivesse ido por ali”. Tudo agora é fluir.
Abrindo aqui um parênteses, um cara não tem saído da minha cabeça ultimamente. Cat Stevens foi um dos músicos que mais marcou a minha vida, principalmente pela canção de Ensina-me a viver. Mas sua presença sempre foi uma grande ausência quando se converteu ao islamismo e parou de cantar. Pois quase trinta anos depois ele voltou, e voltou com outro nome, outro rosto, com uma estrada longa nas costas, mas incrível, ele era exatamente o mesmo. Stvens sempre foi Yusuf Islam e este jamais deixou de ser o genial músico que cantava jornadas humanas com olhos sensívies da sua alma. Quando o vi voltar a mídia, e num gesto de grandeza perdoar o plágio do Coldplay, pensei: Caramba, meu Deus, é ele, Cat Stevens que tá ali! O cara que vendeu milhões de discos, das músicas mais lindas, com toda a sua fama, de repente, como pelo sopro de um vento, pegou uma outra direção e passou a viver de ajudar outras pessoas. Toda a sua transformação (e olha que não foi nada pouca, hein!) foi sem planejamentos, sem alarde, silenciosa, leve, tão natural que trinta anos depois ele volta de encontro a ele mesmo como se jamais o tivesse "deixado pelo caminho", compondo novas canções com a mesmísisma alma, e revisitando as antigas mais atuais do que nunca. Tudo se deu, ele apenas se permitiu ir.
Creio que
praqueles que estão vivendo dentro da sua verdade, há um grande
desafio em cada momentinho da sua trajetória. A cada dia basta o seu cuidado.
Se hoje estou aqui é porque hoje estou aqui. Se um dia estarei lá ou
acolá, não sei, não quero ter a prepotência de julgar,
antecipadamente, aquilo que é bom ou ruim pra mim. Em tudo darei
graças! Se soubermos ter essa gratidão com aquilo que nos chega, aquilo
que escolhemos, aquilo que se colocou diante de nós, poderemos dar um salto tão
grande dentro da nossa alma que cada situação, cada pequeno gesto, cada detalhe
de um olhar, cada pessoinha, cada minuto no trabalho, passa a ter um valor
imenso, e começamos então a enxergar o grande desafio o grande sonho
acordado que estamos vivendo hoje.
Viver
impregnado de presente pode ser muito mais revolucionário do que
imaginamos. Não só pela gratidão permanente daquilo que conquistamos, mas
porque o outro pode nos vir de uma outra forma, o empecilho pode se tornar um aliado,
a dificuldade, algo natural, e de onde nem percebíamos brotar nada começam sim
a surgir novas expressões de vida! Com o espírito alegre e renovado para o
novo dia, a cada novo dia, o nosso olhar pode promover transformações que
nem nos sonhos e projetos mais espetaculares que imaginamos pra gente podemos
alcançar. Simplesmente porque junto do "milagre" que a acontece
na nossa frente está o nosso coração pulsando ali, marcando o tempo e
mostrando pra gente o quanto do nosso potencial que ainda podemos dedicar
ao que temos.
“A vida é
o que acontece enquanto fazemos planos para o futuro”, disse Jonh Lennon, mas creio também que a vida é o que deixa de acontecer quando decidimos não
extrair do momento presente o máximo que ele pode nos dar. Olhando
pra Yusuf Islam, ouvindo ele falar e cantar, mesmo quando é sobre sua
conversão, vejo o mesmo Cat Stvens, o mesmo, é incrível! Percebo que a forma como ele se entregava de corpo e alma a sua vida antes da
mudança, é a mesma com que se entregou depois desta e se entrega até hoje.
Colocar
todo o nosso coração no momento, seja ele qual for, é a única maneira de ir seguindo por
essa vida na certeza de que sempre estamos no caminho certo. Se abrindo para receber o que temos é que chegamos onde nem imaginamos que queremos.
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